Previdência privada vale a pena?

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Idosos de branco na praia: foto padrão de propaganda de previdência privada

Você começou a fazer planos para sua aposentadoria, ouviu falar que é possível ter uma renda vitalícia e está considerando investir em uma previdência privada?

O gerente do seu banco te ofereceu uma previdência privada, te explicou que não entra no inventário, que você pode até deduzir imposto de renda, e você está pensando em investir?

Você recebeu um e-mail interno de sua empresa falando de um plano de previdência deles (com uma foto tão bonita quanto a deste artigo) e ficou interessado?

Antes de tomar esta decisão, peço que invista 5 minutinhos e leia este artigo.

O que é previdência privada?

Na teoria, previdência privada é um plano de aposentadoria complementar à previdência social ligada ao INSS. É um “plano de aposentadoria” que você faz para suplementar o que o governo te oferece.

Na prática, é muito semelhante a investir em um fundo de investimento, mas com algumas regras diferentes (tributação, taxas, modalidades).

A grande popularidade deste produto é alinhada com a ideia de que ninguém em sã consciência confia a sua aposentadoria ao planejamento do governo. Sobretudo no Brasil.

Quando que a previdência privada vale a pena?

Já vou ser rápido e sincero: a previdência privada costuma não valer a pena para a grande maioria dos casos.

Mas é mentira falar que ela é sempre pior. Há 3 casos específicos em que ela pode valer a pena, talvez você se enquadre em um deles:

1 – Previdência privada com contribuição a mais da empresa

Muitas empresas possuem um plano de previdência especial, no qual elas contribuem com algum valor além do que você contribui. Exemplo: o dobro da aplicação (para cada R$ 1 investido, a empresa acrescenta mais R$ 1).

Neste caso, muito provavelmente a previdência é uma boa opção, desde que você contribua somente até o valor que a empresa se propõem a contribuir a mais.

Mas é sempre válido saber claramente quais as condições para manter este tipo de benefício, que as vezes são os de trabalhar a vida inteira e se aposentar pela mesma empresa.

2 – Planejamento sucessório (transmissão de herança)

A previdência privada pode fazer sentido para quem está fazendo um planejamento sucessório, isto é, para quem está poupando para os herdeiros, e não para si próprio.

Mas lembre-se: ela é uma pequena parte deste planejamento.

Explico.

Após um óbito, o dinheiro que está na previdência privada não passa por inventário e, pelo menos por enquanto, não possui cobrança de ITCMD (o imposto cobrado na hora de transmitir herança aos herdeiros). Por este motivo é interessante manter uma parcela pequena de seu patrimônio na previdência exatamente para pagar o ITCMD (hoje 4% em São Paulo) do restante do patrimônio que será tributado. Isto porque, se os herdeiros não puderem pagar este imposto, o inventário não é liberado para eles.

Não entendeu ainda? Bom, não é tão simples mesmo. Por isso que é recomendável consultar um especialista no planejamento sucessório, que fará esta conta para você. Minha sugestão é que, se você não entendeu, é porque você não se enquadra neste caso.

É válido lembrar também que, somente com uma previdência privada, você pode apontar alguém escondido como beneficiário direto, como uma amante, amigo, cachorro e etc. Mesmo assim não é 100% garantido, pois se seus herdeiros se sentirem lesados, eles poderão contestar na justiça esta “estratégia”.

3 – Quem faz a declaração de IR completa, opta por PGBL e contribui com até 12% da renda

Um dos argumentos mais utilizados pelos vendedores de previdência privada (ex.: seu gerente do banco) é falar que a modalidade PGBL tem um benefício fiscal. Este benefício consiste em poder descontar parte do imposto se você investir até 12% de sua renda.

Na verdade, este “desconto” é um diferimento, e não uma isenção ou desconto de verdade.

Em poucas palavras, diferimento significa adiar o pagamento do imposto, o que pode ser algo bom.

Imagine você, com 30 anos de idade e mil gastos e prestações, ter a possibilidade de adiar o pagamento de uma parte do seu imposto de renda para quando você for aposentado.

Não parece ruim, certo?

Mas lembre-se, é preciso seguir 4 regras para este “adiamento” de imposto valer a pena:

  1. Fazer a declaração de IR completa (para grande parte das pessoas a dedução é maior com a declaração simples)
  2. Optar pelo PGBL
  3. Contribuir com no máximo 12% da renda
  4. Ter o prazo de 10 anos no mínimo

Ok, e quando que a previdência privada NÃO vale a pena?

Os casos que falei antes são exceções à regra.

A previdência privada não vale a pena financeiramente para praticamente TODOS os outros casos.

Vamos enumerar alguns casos que não valem a pena para você se identificar. Normalmente não vale a pena se:

  • É de algum banco grande (isso inclui o banco no qual você é correntista)
  • Foi feita para os filhos (ex.: pagar estudos do filho)
  • É um planejamento para aposentadoria
  • É um planejamento para guardar dinheiro para algum objetivo
  • É da sua empresa e ela não contribui a mais
  • É 100% do seu planejamento sucessório (e não uma pequena parte)
  • É um investimento (pelo menos você acha que é)
  • Tem PGBL e faz declaração de IR simplificada
  • Pensa em resgatar no curto/médio prazo (menos de 10 anos)
  • Pensa que a Receita Federal não vai achar recursos não declarados
  • Qualquer outro caso diferente dos 3 que mencionei antes

Se identificou? Pois é, provavelmente previdência privada não é para você. Não se identificou nem nesses itens, nem nas exceções que citei antes? Então acho que também não vale a pena.

Mas é bom saber o porquê de não valer a pena.

Taxas e mais taxas

Além da taxa de administração, que é similar a cobrada em fundos de investimentos (e pode ser abusiva), a previdência privada pode ter também as seguintes taxas:

  1. Taxa de Saída: cobrada no momento do resgate. Como se resgatar o seu próprio dinheiro fosse errado e você estivesse pagando uma multa para fazer isso. Ridículo.
  2. Taxa de Carregamento: cobrada no momento da aplicação. Um exemplo fácil é que, se a taxa de carregamento for 1% e você aplicar R$ 1.000, apenas R$ 990 serão realmente aplicados e R$ 10 serão cobrados como taxa de carregamento. Em outras palavras, você já começa com 1% de rendimento negativo.

Não são todos os planos que cobram isso, mas é preciso estar atento porque estas taxas reduzem muito o retorno.

Rentabilidade baixa: a vilã

Este é o principal motivo da previdência privada não valer a pena. Ela nada mais é que um veículo ineficiente para poupar dinheiro. Toda a vantagem tributária que poderia ter, fica com os bancos.

Normalmente a rentabilidade de produtos de previdência privada oferecidos para você é bem menor que de outros produtos disponíveis no mercado.

E há diversos motivos para este baixo rendimento, como por exemplo uma taxa de administração muito alta. Mas o principal motivo é o mais impressionante: o contribuinte do plano simplesmente não presta atenção na rentabilidade!

Em previdências oferecidas por empresas é bem interessante também (tenho inúmeros exemplos de amigos que vieram me perguntar se a previdência da empresa dele valia a pena).

Nelas, muitas vezes os planos são vendidos apenas pelo perfil: conservador, moderado e agressivo. Se vende também várias projeções lindas de crescimento de patrimônio, renda vitalícia e etc, mas nunca se fala em números reais de rendimento, ou se acompanha a rentabilidade!

O ensinamento que fica disso é: saiba o rendimento do seu fundo de previdência. Procure. Compare. Como tudo, há produtos bons e ruins. Mas no caso de previdência, é difícil achar o bom. Uma comparação rápida com o CDI já é suficiente para você descartar inúmeros planos de previdência.

A dica inicial é fugir de bancos grandes, como em qualquer investimento, e tratar a previdência como você trata um investimento normal. Outra dica é buscar previdências de gestores independentes, que normalmente estão com interesses alinhados com os investidores.

E fica aqui um desafio: Se o leitor encontrar um fundo de previdência de um banco grande com rentabilidade maior que 100% do CDI na média de vários anos, poste aqui para provar que eu estou errado.

Então devo ou não devo investir em previdência privada?

A resposta curta é: Não.

Se você não se enquadra nas exceções que eu falei, a previdência sempre será pior que um bom fundo de investimento, ou até mesmo um título de renda fixa.

Então eu devo resgatar tudo?

Calma. Se você já tem algum investimento em previdência privada, a resposta não é tão óbvia assim, é preciso fazer as contas antes.

Mas já te adianto: provavelmente você perderá muito dinheiro resgatando tudo o que já tem. Isso por causa de altas alíquotas de imposto de renda (para prazos curtos de resgate) e taxas de saída que podem existir.

O recomendado a fazer na grande maioria dos casos é efetuar a portabilidade para um fundo de previdência melhor. E obviamente não fazer mais contribuições no plano.

Portabilidade de previdência privada

Hoje é possível transferir os recursos entre previdências privadas sem pagar taxas de saída ou impostos. Desta forma você pode migrar para um plano de previdência melhor, para resgatar somente quando sua alíquota de IR for menor.

Para isto, basta seguir as regras abaixo:

  • Não é possível mudar a modalidade: somente de PGBL para PGBL e de VGBL para VGBL
  • O pedido só pode ser feito após 60 dias da aplicação

Após o pedido, a portabilidade deve ser feita em até 5 dias, senão há multas para a instituição. O que ouço de muitas pessoas é que costuma levar cerca de 30 dias, pois os bancos ficam enrolando com a esperança de que o cliente esqueça (É sério!). Se ocorrer com você, não tenha dúvidas: cobre do gerente, e se estourar o prazo, reclame com os órgãos de fiscalização!

E como escolher um plano de previdência melhor?

Se você está interessado em efetuar a portabilidade para um plano de previdência melhor ou se você se enquadra no caso 3 de quando a previdência pode valer a pena (isto é, faz declaração de IR completa, opta por PGBL e contribui com até 12% da renda), o passo agora é entender melhor como funciona e quais as melhores opções.

No próximo artigo, explicaremos com mais detalhes o funcionamento da previdência privada: que tipo de plano escolher (PGBL ou VGBL), qual regime de tributação (regressiva ou progressiva) e outras dicas para escolher um bom plano. Ele já foi publicado e pode ser acessado neste link.

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Vitor Nagata é editor do Blog do Investidor e profissional da área de investimentos.

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46 COMMENTS

  1. Vitor, aparentemente essa previdência rende um pouco mais que CDI historicamente.
    Razão Social: CSHG MAPFRE JURO REAL FUNDO DE INVESTIMENTO EM COTAS DE FUNDO DE INVESTIMENTO MULTIMERCADO PREV
    CNPJ: 08.056.837/0001-64

    Hoje tenho capacidade de utilizar R$ 1.000,00 para investimentos e estava pensando em fazer aportes de R$ 300,00 nesta previdência da Mapfre. O que você acha?

  2. Vitor, o que você acha da previdência privada da Funpresp para os servidores federais? Fiz a adesão em fevereiro de 2017, mas já ouvi tantas especulações sobre a incerteza das contrapartidas do governo federal que estou pensando em desistir deste adesão.

  3. Estou querendo entrar em uma previdência privada onde não há taxas de administração e carregamento, é feito por débito em conta para evitar Ted/doc. A rentabilidade é mais ou menos 105% do CDI de um fundo de investimento. Essa rentabilidade é boa? Grato!